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Câmara de Loures vai desperdiçar milhares de euros em licenças informáticas

Bloco de Esquerda apresentou uma proposta para que o Município de Loures passasse a usar software livre. Abstenção de CDU, PS e CDS-PP e os voto contra de PSD e PPM inviabilizaram a proposta bloquista na Assembleia Municipal. Câmara Municipal de Loures continuará a gastar milhares de euros a contratualizar licenças informáticas, quando podia optar por uma alternativa livre, gratuita e mais segura. Bloco e PAN votaram a favor. 

Leia a proposta apresentada pelo Bloco de Esquerda na sessão de 30 de novembro da Assembleia Municipal de Loures:

UTILIZAÇÃO DE SOFTWARE LIVRE NO MUNCÍPIO DE LOURES

Apesar das alternativas, muitos setores na administração pública local mantêm-se reféns de relações contratuais que lhe são desfavoráveis com as empresas de software, como é o caso da autarquia de Loures.

O software não livre utilizado não permite o acesso ao código-fonte, tanto do sistema operativo quanto das aplicações, implicando uma total impossibilidade de controlo sobre a tecnologia usada para gerir a informação disponível em suporte digital.

Os riscos de existência, quando se trata de software não livre, de «portas traseiras», no que toca à segurança da informação, são hoje ainda mais evidentes. Assim, não existe qualquer garantia em relação ao possível reencaminhamento da informação para outros. Mais: fica-se dependente do seu fornecedor, num setor cada vez mais monopolizado, para aceder à sua própria informação. As constantes modificações e contratos de upgrade feitas com os fornecedores acentuam e perpetuam a dependência tecnológica em relação ao fabricante.

O caminho para o controlo da tecnologia e da informação é o da utilização por parte de todo o Estado, a cada nível de produtos, de sistemas operativos e aplicações que reúnam a possibilidade de o próprio Estado inspecionar detalhadamente o seu funcionamento e que estes possam por si ser modificados e distribuídos. Estes produtos existem há mais de uma década com o nome de software livre.

O projeto GNU, da Free Software Foundation, criada por Richard Stallman em 1984, marcou o início do Movimento de Software Livre, para mudar a situação de dependência generalizada das empresas e Estados em relação aos grandes produtores de software. O primeiro objetivo deste movimento seria o de desenvolver um sistema operativo compatível com o UNIX, que seria 100% livre, tanto para a sua modificação como para a sua distribuição. O novo software deveria partir das seguintes premissas:

— Liberdade para executar o programa, fosse qual fosse o propósito;

— Liberdade para modificar o programa com o objetivo de o adaptar à necessidade do utilizador;

— Liberdade de redistribuir cópias;

— Liberdade de distribuir versões modificadas do programa, de tal forma que a comunidade pudesse beneficiar com as melhorias que vão sendo feitas.

Em 1991 um estudante finlandês de 21 anos, Linus Torvalds, deu um passo fundamental neste sentido, com a apresentação do LINUX, que abriu a possibilidade da utilização maciça de software livre em computadores pessoais.

Desde então o software livre tem sido desenvolvido e aperfeiçoado constantemente por inúmeros programadores qualificados em todo o mundo, conseguindo soluções estáveis e de qualidade superior aos produtos não livres.

Hoje várias das principais empresas da indústria informática aderiram aos princípios da Free Software Foundation e estão a ser desenvolvidas muitas soluções para várias aplicações. O sistema operativo LINUX é usado por milhões de pessoas em todo o mundo. Os produtos estão disponíveis no mercado, com diferentes condições para o seu uso. No entanto, é importante recordar que o software livre nem sempre é gratuito.

A maioria das empresas e utilizadores individuais aderiu a este tipo de programas porque ele lhes permitia:

1 — A liberdade de criar soluções próprias que muitas vezes estariam comprometidas pela dependência em relação a soluções fechadas de software;

— A segurança e estabilidade funcional dos seus sistemas de informação na produção, organização, gestão e distribuição de informações;

— A possibilidade de reutilizar equipamento informático que estaria obsoleto, graças às menores exigências de capacidade de processamento do software livre baseado no GNU;

— A drástica redução de custos.

Antes de mais, a experiência mostra que o software livre dá maiores garantias de segurança e de defesa da privacidade dos cidadãos. Diminui, com a utilização deste software, o risco de infiltração nos dados confidenciais, de inacessibilidade dos dados e de manipulação por elementos estranhos aos serviços autorizados.

Passa-se também a estar mais livre para decidir, a qualquer momento, quem devem ser os seus parceiros e fornecedores e, em muitos casos, ser ele mesmo a controlar, corrigir ou modificar os programas para adequá-los às suas necessidades.

O software não livre limita quer o usuário quer os profissionais a executar os programas e não lhes dá liberdade de inspecioná-lo e corrigi-lo. Os profissionais locais vêm, assim, as suas potencialidades limitadas e há, neste caso, uma distorção do mercado e uma limitação dos horizontes profissionais dos técnicos nacionais. O software livre é também uma fonte de trabalho para os programadores nacionais.

Apesar do investimento inicial no processo migratório e na formação, os custos do software livre são consideravelmente reduzidos, quer em despesas em licenças quer em despesas no hardware, apoio técnico e atualizações. Para além de libertar do pagamento de muitas licenças, o software livre prolonga a vida útil dos computadores em uso e exige menos atualizações (quantas vezes desnecessárias) que, aumentando os custos, raramente correspondem às necessidades específicas dos utilizadores.

Quanto à questão da segurança, sabe-se hoje claramente que as falhas são resolvidas mais rapidamente no software livre. Não foi por acaso que quer o Ministério da Defesa Francês quer a NASA e a Armada Norte-Americana optaram, por razões de segurança, pelo software livre, muito mais fiável e controlável pelo próprio Estado. Recentemente, até a própria administração central, salvo exceções específicas, passou a priorizar a utilização de software livre.

Quanto aos custos, a sua redução verifica-se de várias formas: os serviços de apoio e manutenção são mais competitivos e a escolha mais variada, os custos de instalação são mais baixos, a manutenção, por poder haver intervenção do utilizador e o programa poder ser modificado, pode fazer-se sem recorrer sempre aos serviços de apoio do fornecedor e não existem programas desnecessários instalados, diminuindo custos e problemas.

O investimento na migração (mudança de sistema) é o mais significativo. Mas se isto é verdade em relação à mudança para o software livre, é igualmente verdade para mudança de um software não livre para outro. Sabendo-se que quanto mais tarde se faz a migração mais difícil ela será, a questão é saber se para poupar, estamos condenado a nunca mudar de fornecedor.

Também em relação à compatibilidade, o problema surge igualmente para sistemas diferentes, e é até mais acentuado do que em relação ao software livre.

Ao contrário do que pretendiam as grandes empresas na área do software, existe atualmente um sustentado apoio técnico na área do software livre. Para além de pequenas empresas locais, que também existem em Portugal, as maiores empresas multinacionais que se dedicam à prestação de serviços na área de software têm adotado, em vários casos, soluções de software livre e têm feito importantes investimentos nesta área. As conferências internacionais ligadas ao software livre juntam dezenas de milhares de utilizadores e as maiores empresas da indústria do setor.

Assim, nos termos regimentais aplicáveis, a Assembleia Municipal de Loures delibera:

1 – Recomendar à Câmara Municipal de Loures que todos os serviços da autarquia passem a estar obrigados a utilizar software livre nos seus sistemas e equipamentos informáticos; 

2 - Que se considera que software livre é aquele cuja licença de uso garanta ao seu utilizador, sem custos adicionais, a possibilidade de executar o programa para qualquer fim, redistribuir cópias, estudar como funciona o programa e adaptá-lo às necessidades do utilizador e, ainda, melhorar o programa e publicar essas melhorias, sendo o acesso ao código-fonte um requisito para estas faculdades;

 3 – Que apenas em casos excecionais pode ser utilizado software não livre, desde que devidamente justificado e comunicado previamente à Assembleia Municipal;

 4- A Câmara Municipal de Loures tem um ano, a partir da aprovação da moção, para implementar a transição completa dos seus sistemas e equipamentos para software livre.  

Carlos Gonçalves,
Deputado do Bloco de Esquerda